Milena
Dutra
Professora com alunos: ouvinte e deficiente auditivo
Segundo o Instituto Nacional de Educação de Surdos:
A deficiência auditiva traz algumas limitações para
o desenvolvimento do indivíduo, uma vez que a audição é essencial para a
aquisição da língua oral.
Inicialmente,
a surdez interfere no relacionamento da mãe com o filho e cria lacunas nos
processos psicológicos de integração de experiências que irão afetar em maior
ou menor grau, a capacidade normal de desenvolvimento do indivíduo. Embora não
se tenha uma estatística geral, é grande a incidência de casos de surdez.
O Censo
Escolar/2004 computou 62.325 crianças surdas matriculadas nas escolas de todo o
país. Esse fato trouxe a necessidade de preparar os professores para atender,
de forma adequada, essa população.
O
objetivo deste texto é, portanto, fornecer informações básicas sobre a audição,
a deficiência e o deficiente auditivo, para facilitar a intervenção do
professor de Educação Física, nas turmas onde estiverem incluídos alunos
surdos.
Audição:
É o
sentido por meio do qual se percebem os sons. O processo normal da audição
inicia com a captação de ondas sonoras pela orelha externa e prossegue através
da condução dessas ondas pela orelha média. Ao chegar à orelha interna, as
ondas sonoras são transformadas em impulsos elétricos, que são enviados ao
cérebro. No cérebro se dá a decodificação dos sons, o que caracteriza audição
propriamente dita.
O som
possui características que influem na audição. Uma delas é a sua capacidade de
se propagar nos meios gasoso, líquido ou sólido. Essa propagação se dá sob a
forma de ondas, provocando uma vibração tal que é capaz de ser transmitida para
o cérebro através do ouvido (meio gasoso / ar) e do corpo como um todo (meio
sólido / ossos). Outras características que influenciam diretamente na
qualidade da audição são a intensidade e a freqüência. A intensidade é
determinada pela amplitude da onda sonora, refere-se ao volume do som e é o que
permite distinguir um som forte de um som fraco. É medida em decibéis (dB).
A
freqüência varia de acordo com a quantidade de ondas emitidas em um determinado
espaço de tempo e é o que faz com que um som seja alto (agudo) ou baixo
(grave). É medida em Hertz (Hz) ou Ciclos por Segundo. Assim sendo, a
capacidade de ouvir determinados sons vai depender da conjugação entre o grau
de perda em decibéis e as freqüências preservadas na orelha interna.
É através
do cruzamento dessas duas informações que se obtém o resultado da audiometria,
que é o exame que determina o grau de audição das pessoas.
Deficiência
Auditiva:
Essa
expressão sugere a diminuição ou a ausência da capacidade para ouvir
determinados sons, devido a fatores que afetem quaisquer das partes do aparelho
auditivo. A Política Nacional de Educação Especial define a deficiência
auditiva como sendo a “perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da
capacidade de compreender a fala através do ouvido” (BRASIL, 1994).
Essa
definição permite concluir que:
1)
Existem diferentes graus de perda auditiva;
2) A
surdez pode ocorrer em diferentes fases do desenvolvimento;
3) A sua
pior conseqüência é a impossibilidade de ouvir a voz humana (fala).
Dependendo
da época da instalação da deficiência e do grau da perda auditiva, o indivíduo
pode ter dificuldades no relacionamento, na comunicação, na compreensão de
conceitos e regras e na apreensão de conhecimentos através dos meios mais
comuns (a língua oral e textos)
No padrão
normal de audição, o limiar de audibilidade vai até 25 dB em todas as
freqüências do espectro sonoro (entre 250 e 8000 Hz).
Já a
classificação do grau de perda, segundo o Padrão ANSI (1969), é a seguinte:
Audição
normal 0 a 25 dB
Deficiência
leve 26 a 40 dB
Deficiência
moderada 41 a 55 dB
Deficiência
acentuada 56 a 70 dB
Deficiência
severa 71 a 90 dB
Deficiência
profunda Acima de 90 dB
A perda
leve permite ouvir os sons, desde que estejam um pouco mais intensos. Na perda
moderada há a necessidade de se repetir algumas vezes o que foi dito, dificuldade
de falar ao telefone, com a possibilidade de troca da palavra ouvida por outra
foneticamente semelhante (pato/gato, cão/não, céu/mel). A perda acentuada não
permite ouvir o telefone, a campainha e a televisão, tornando necessário o
apoio visual para a compreensão da fala. A perda severa permite escutar sons
fortes, como os de caminhão, avião, serra elétrica, mas não permite ouvir a voz
humana sem amplificação. Na perda profunda só são audíveis sons graves que
produzam vibração (trovão, avião).
Assim
sendo, se uma criança já nasce com ou adquire uma surdez severa ou profunda
antes de ter acesso à língua oral de sua comunidade, vai ter muitas
dificuldades de se integrar ao “mundo dos ouvintes”. Embora seja absolutamente
necessário dominar a língua de sua comunidade, mesmo que somente na modalidade
escrita, sabe-se que a língua de mais fácil acesso para os surdos é a de
sinais. É por meio dela que esses indivíduos constroem sua identidade e
desenvolvem-se nos aspectos afetivo, cognitivo e social.
Logo,
faz-se necessário que, desde cedo, a criança surda seja exposta a esta língua e
que a família e a escola a utilizem como meio de comunicação e instrução. No
Brasil, a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é reconhecida como meio legal de
comunicação e expressão dos surdos pela Lei nº. 10.436, de 2002. Apesar disso,
em seu parágrafo único, a referida lei reza que a LIBRAS não poderá substituir
a modalidade escrita da língua portuguesa. Desta forma, não só é assegurado ao
surdo ouso da língua de sinais, como é exigido dos sistemas educacionais o
ensino, tanto da LIBRAS, quanto do português escrito.
Alfabeto em libras A
inclusão de crianças surdas na rede regular vai gerar a necessidade do
aprendizado da LIBRAS pelo restante da comunidade escolar. As línguas orais e
as de sinais possuem estruturas completamente diferentes-uma é de modalidade
oral-auditiva e a outra de modalidades espaço-visual - e a língua oral,
principalmente na forma escrita, é muito mais complexa que a de sinais, o que
dificulta o seu aprendizado por parte dos surdos que usam a LIBRAS.
Alfabeto em Libras |
No
entanto, a experiência tem demonstrado que os surdos que estudam em escolas
regulares possuem leitura mais eficiente, o que influencia na escrita e na sua
integração com a comunidade.
Atividade
Física para Surdos:
A surdez
afeta apenas o aparelho auditivo, não trazendo nenhum outro prejuízo, além dos
já citados. Desta forma, o desenvolvimento motor de crianças surdas costuma
seguir os padrões de normalidade, não havendo, portanto, nenhuma restrição à
prática de atividade física. Quando a surdez é acompanhada de outra deficiência
ou de algum outro comprometimento, as possíveis restrições estarão relacionadas
a esses(s) outro(s) problema(s).
A escolha
de atividades físicas para pessoas surdas deve respeitar os mesmos critérios
usados para a seleção de atividades para crianças sem deficiência (condições de
saúde, faixa etária, condicionamento físico, interesse etc.).
As
atividades aeróbicas são muito importantes, pois as crianças que não se
utilizam da fala costumam ter uma respiração “curta”, isto é, não enchem
completamente os pulmões deixando, com isto, de expandir a caixa torácica e de
exercitar os músculos envolvidos na respiração. Assim sendo, além de todos os
benefícios cardiovasculares já conhecidos, no caso dos surdos, as atividades
aeróbicas também podem contribuir, indiretamente, para o aprendizado da emissão
de sons da fala.
Os surdos
podem praticar qualquer tipo de esporte e de atividade rítmica. No caso dos
esportes, não há necessidade de qualquer adaptação na forma de ensinar,
conduzir ou arbitrar. Tampouco há adaptações nas regras de cada modalidade. Já
as atividades rítmicas, se envolverem coreografia, costumam demandar um pouco
mais de tempo de treinamento, devido à necessidade de internalizar o tempo e o
andamento da execução dos movimentos sem o auxílio de uma trilha sonora (mesmo
com boa amplificação os surdos não conseguem perceber a maior parte das nuances
de uma música).
Estratégias
de ensino:
Sinais
visuais à Cartelas coloridas ou bandeiras podem substituir comandos de voz;
figuras podem indicar o movimento a ser feito; números podem evidenciar
seqüências de atividades, ou a repetição de uma atividade já realizada, ou o
número da tarefa a ser executada, ou a quantidades de crianças que devem se
agrupar.· Demonstração, o professor costuma ser o modelo, mas é possível
solicitar que os próprios alunos façam demonstrações.
Orientações
ao Professor
1 - Com
relação ao relacionamento:· Enxergar mais a criança que a deficiência;·
Considerar as limitações, mas enfatizar as capacidades;· Estar informado sobre
a etiologia, o local e a gravidade da surdez;· Ser paciente e acolhedor, sem
deixar de estabelecer limites.
2 - Com
relação à comunicação:· Falar de frente, em velocidade normal, quando a criança
estiver olhando;· Usar frases curtas e simples, mas corretas;· Usar gestos, se
necessário, e esforçar-se para entender os gestos das crianças;· Recorrer a
outras formas de comunicação (desenho, escrita, mímica), sempre que for necessário;·
Aprender LIBRAS;· Não misturar a LIBRAS com o Português.
3 - Com
relação à prótese auditiva (quando houver):· Não mergulhar na água, nem
molhar;· Não permitir o uso durante lutas ou acrobacias;· Incentivar o uso
durante atividades rítmicas (exceto dentro d’água);· Se o molde estiver pequeno
para a orelha da criança, retirar antes de qualquer atividade física;· Guardar
os aparelhos em local seguro para que não se quebrem ou se misturem.
Considerações
Finais
Incluir
alguém em um grupo é dar-lhe condições para que possa participar ativamente das
idéias e atividades do mesmo. Sabe-se que as escolas regulares ainda não estão
suficientemente preparadas para receber e propiciar uma inclusão real das
crianças surdas, mas isto precisa mudar.Para tanto, é preciso que toda a
comunidade escolar se abra para essa nova experiência,pois, com a troca, todos
têm a ganhar.
As aulas
de educação física podem ser momentos e espaços privilegiados para iniciar uma
mudança de comportamento dentro da escola. O papel do professor em todo esse
processo é primordial e deve ser assumido com responsabilidade. Existem,
atualmente, muitas fontes de informação disponíveis (instituições, internet,
livros, periódicos), mas, mais do que isso, é preciso que haja o reconhecimento
do direito de TODAS as crianças de participar das aulas de educação física e
demais atividades escolares.
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